Gaepe-Brasil articula diagnóstico nacional sobre demanda por vagas em creches

Em reunião que tratou sobre o tema, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) se dispôs a contribuir com levantamento de dados

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O Gabinete de Articulação para a Efetividade da Política da Educação no Brasil (Gaepe-Brasil) discutiu caminhos para a realização de um levantamento nacional sobre a real demanda por creches no país, bem como de um mapeamento das ações judiciais nesse tema. O objetivo é que essas informações possam apoiar a gestão pública em medidas para garantir o direito à educação na primeira infância. No encontro, que se deu em 26 de fevereiro, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apresentou uma agenda voltada às crianças de 0 a 5 anos e se dispôs a apoiar o levantamento de dados para a consolidação desse diagnóstico.

Dados do Censo Escolar 2023, divulgados recentemente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep/MEC), mostram que o Brasil retomou o crescimento de matrículas em creches, que havia tido uma queda em 2020 e 2021, devido à pandemia da covid-19. Segundo o órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC), o Brasil precisaria ampliar em 900 mil o número de matrículas até o final deste ano para que fosse cumprida a meta 1 do Plano Nacional de Educação (PNE), cujo texto prevê que ao menos 50% das crianças de 0 a 3 anos estejam na escola até 2024.

Alessandra Gotti, presidente executiva do Instituto Articule, ponderou na reunião, que, embora seja uma etapa não obrigatória, o direito à creche é constitucional e deve ser garantido a todas as crianças que precisam. Um desafio, porém, é que não se sabe exatamente qual a necessidade real de vagas nesta etapa. Além disso, Alessandra pontuou que há casos de famílias em situações de extrema vulnerabilidade e, como ainda não há vagas para toda a demanda, é necessário que haja, em paralelo ao esforço de planejamento de expansão, a priorização do atendimento para as crianças que mais precisam.

A presidente executiva do Articule destacou três aspectos para avançar na garantia de creche para toda a demanda, especialmente para aquelas em situação de maior vulnerabilidade.

  • A realização de um diagnóstico para que se tenha conhecimento do tamanho da fila de espera e da necessidade por creche no Brasil, e, dessa forma, apoiar políticas públicas articuladas entre as diferentes esferas de governo, uma vez que os municípios sozinhos não têm dado conta de promover a expansão necessária; 
  • Em segundo lugar, o estabelecimento de critérios para a priorização de vagas até que a expansão seja concretizada, dando prioridade para atender crianças que mais precisam. Há experiências nesse sentido que têm tido resultados, como em Rondônia (veja em nosso relatório, a partir da pág 26) e em Mato Grosso. E há um projeto de lei no Congresso Nacional (PL 2914/2019), sobre o qual o grupo concordou em mobilizar esforços para promover debates e aprimoramentos, visando a inclusão de critérios ainda não constantes no PL, como crianças com deficiência ou em situação de violência doméstica;
  • Por fim, para a expansão de vagas em creche, é necessário mapear a necessidade de atendimento nesta etapa no país. Sobre esse ponto, a proposta é aprimorar o Índice de Necessidade de Creche (INC), criado pela Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, e adotá-lo como política pública para que esse indicador possa ser implementado em todo o Brasil, aferindo dados tanto na zona urbana (como é hoje), como nas áreas rurais.

O diagnóstico do déficit de creches proposto abarcaria dois aspectos: a demanda manifesta, ou seja, a fila de espera por vaga nos municípios, e um mapeamento das ações judiciais que correm nas defensorias públicas e tribunais de justiça do país. Para Alessandra, mensurar a judicialização nessa área ajuda a entender como o Sistema de Justiça tem atuado no assunto, uma vez que ele pode ser parte importante de mudanças estruturais, à exemplo do caso paulistano, em que o Tribunal de Justiça induziu um plano de expansão que zerou a fila de espera no município de São Paulo (saiba mais sobre esse caso aqui).

Foi lembrado, durante a reunião, que informações sobre a judicialização estão agora mais viáveis de serem organizadas, pois o CNJ implementou as Tabelas Processuais Unificadas (TPUs) da educação, trabalho desenvolvido em parceria com o Articule, e que há um painel com dados disponíveis.

Rebeca de Mendonça Lima, juíza auxiliar da presidência do CNJ, comentou no encontro sobre uma agenda do Judiciário para a educação infantil, com temas como acesso à escola, busca ativa escolar e material didático adequado, que aguarda votação do órgão para ser implementada; e reforçou a necessidade de informações mais precisas sobre o tema no Brasil. Também representando o CNJ na reunião, Ivânia Ghesti, gestora adjunta do Pacto Nacional pela Primeira Infância no órgão, afirmou que há disposição da entidade em apoiar a realização do levantamento de dados para o diagnóstico sobre creches, articulando as entidades que fazem parte desse compromisso.

Vivian Ka, assessora de políticas públicas educacionais da Undime Nacional, complementou a discussão ao mencionar o Observatório da Rede Nacional da Primeira Infância, que reúne informações dos municípios que já têm planos municipais para esse público, manifestou a intenção da Undime Nacional de participar do esforço coletivo de levantamento de dados, em função da importância de construir as pesquisas em conjunto com os gestores municipais para manter os procedimentos alinhados com as necessidades dos territórios.

Ao longo do encontro, integrantes do Gaepe-Brasil apontaram também outros desafios para assegurar o direito à creche: 

  • a dificuldade em garantir que municípios atendam as decisões judiciais; 
  • a falta de planejamento para a expansão de vagas – como identificado em levantamentos dos Gaepes de Mato Grosso, Piauí, Rondônia e Goiás com os gestores municipais desses estados; 
  • a falta de recursos para realizar adequadamente o atendimento a crianças com deficiência, resultando, muitas vezes, na sua retirada do ambiente escolar pela família;
  • a falta de educadores com formação adequada para a etapa.

A governança definiu que articulará uma formação para os gestores municipais de educação sobre planejamento de expansão de vagas na educação infantil.

Saúde e educação juntas pela primeira infância

Diferentes membros do Gaepe-Brasil enfatizaram a necessidade de articulação entre as áreas da saúde e da educação para melhorar o atendimento integral para a primeira infância no Brasil. 

Um dos pontos citados como exemplo foi a necessidade de algumas mães terem que interromper a amamentação nos primeiros meses de vida do bebê para não perder a vaga na creche, uma vez que as creches públicas, em geral, não aceitam que seja enviado leite materno para alimentação da criança. Essa situação vai na contramão do que é recomendado pelos órgãos de saúde nacionais, como o Ministério da Saúde, e internacionais, como a Organização Mundial de Saúde (OMS), que preconiza a alimentação de crianças até os seis meses exclusivamente com aleitamento materno. “É necessária uma abordagem integrada que não sacrifique um direito em detrimento de outro”, ressaltou Ivânia, do CNJ.

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